Buscando esfriar o clima no Congresso, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio da Advocacia Geral da União (AGU), entrou com um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Corte recue das mudanças feitas nas regras das emendas parlamentares e mantenha os termos do projeto de lei complementar (PLP) aprovado no Parlamento.
O pedido foi protocolado na terça-feira (3) e focou em três pontos: a exigência prévia de plano de trabalho para as chamadas emendas pix (transferências especiais); a identificação nominal do parlamentar nas emendas de bancada e de comissão; e o estabelecimento de critérios para limite de crescimento de despesas com as emendas.
“A decisão do ministro Flávio Dino reforça a essência do que estabelece a Lei Complementar nº 210/2024, que é dar mais transparência e rastreabilidade às emendas parlamentares. O que estamos fazendo, portanto, é apenas buscar um melhor entendimento sobre três pontos específicos da decisão que, em nossa compreensão, já estão contemplados na norma e refletem aquilo que foi pactuado entre o Governo Federal e o Congresso sobre a matéria”, afirmou o advogado-geral da União, Jorge Messias, que assina a manifestação.
Na segunda-feira (2), o ministro Flávio Dino, relator do caso no STF, liberou a execução das emendas, mas impôs uma série de condicionantes. A liminar foi levada a referendo no plenário virtual. Até o momento, dez dos 11 ministros já apoiaram os termos da decisão.
Segundo o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), se as mudanças não ocorrerem, os parlamentares podem não votar os projetos do ajuste fiscal e as leis orçamentárias de 2025. “A posição do governo é defender no STF a lei complementar, que foi aprovada por esse Parlamento e sancionada sem vetos pelo presidente da República”, disse.
A principal demanda dos parlamentares era manter a forma de cálculo do valor das emendas. Pelas regras atuais, há dois indexadores diferentes para os recursos: as de bancada estaduais são 1% da receita corrente líquida (RCL) do exercício anterior; e as individuais em 2% da RCL de dois exercícios anteriores ao de vigência do Orçamento.
O Congresso tinha aprovado, em acordo com o Executivo, que o crescimento seguiria a regra do arcabouço fiscal: correção pela inflação, mais um aumento real entre 0,6% e 2,5%, equivalente a 70% do incremento das receitas da União no ano anterior.
Dino, por sua vez, determinou que será adotada a regra que resultar no menor valor entre três opções. A mudança favorecerá o governo, que trabalha um ajuste fiscal para conter o crescimento das despesas. Mas os congressistas pressionam Lula a aceitar pelo menos o crescimento real dos recursos.
Outra parte da decisão de Dino que a AGU questionou é a obrigação de que as seja divulgado o deputado ou senador que apadrinhar as emendas de comissão e de bancada ao Orçamento, caso o recurso seja individualizado. A opção do Legislativo é manter sob sigilo o real autor e identificar como responsável as bancadas do partido ou estadual.
Segundo organizações da sociedade civil, ao não identificar o padrinho, a medida reproduz as emendas de relator, conhecidas como “orçamento secreto”.
O próprio Lula fez campanha em 2022 com discurso crítico ao orçamento secreto e ao sigilo sobre os padrinhos das emendas. O petista disse que a modalidade era a “fonte do maior esquema de corrupção da história do país” e que era preciso extingui-lo.
O órgão questionou ainda a necessidade de apresentação de um plano de trabalho para as transferências especiais para Estados e municípios, conhecidas como “emendas Pix” por caírem direto na conta desses entes, sem a necessidade de convênio. Para os congressistas ouvidos pelo Valor, a exigência “burocratizou” essas emendas, que foram criadas justamente para fugir da burocracia e levar os recursos mais rapidamente para prefeitos e governadores.